Os resultados das urnas de 1990 em São Paulo, no interior, na capital ou no total do estado, podem ser analisados de diversos pontos de vista. Um deles poderia ser, por exemplo, a consideração mais detida das razões e dos modos (para não falar dos tempos) nos quais pela segunda vez se praticou o voto em dois turnos.
Resumo
A eleição de 1990 oferece assim boa oportunidade de observação e análise desse mecanismo espontâneo de coligação partidária desde abajo, essa quase irresistível bússola ideológica que a mecânica do jogo eleitoral em dois turnos pode fazer operar e que, este ano em São Paulo, funcionou à revelia das desrazões das direções partidárias do PT
e do PSDB. Seus eleitores fizeram, numa espécie de disciplina republicana, a crítica prática da disciplina partidária.
Dom Casmurro (1899) é um bom ponto de partida para apreciar a distância, na verdade o adiantamento, que separava Machado de Assis de seus compatriotas. O livro tem algo de armadilha, com aguda lição crítica – se a armadilha for percebida como tal. Desde o início há incongruências, passos obscuros, ênfases desconcertantes, que vão formando um enigma. A eventual solução, sem ser propriamente difícil, tem custo alto para o espírito conformista, pois deixa mal um dos tipos de elite mais queridos da ideologia brasileira.
Resumo
Depois de contar o idílio de sua adolescência, completado pelo casamento em que seria traído e pelo desterro até a morte a que obrigou a companheira e seu filho duvidoso, Dom Casmurro conclui por uma pergunta a respeito de Capitu: a namorada adorável dos quinze anos já não esconderia dentro dela a mulher infiel, que adiante o enganaria com o melhor
amigo? Induzido a recapitular, o fino leitor prontamente lembrará por dezenas os indícios do calculismo e da dissimulação da menina. Entretanto, considerando melhor, notará também que as indicações foram espalhadas com muita arte pelo próprio narrador, o que muda tudo e obriga a inverter o rumo da desconfiança.
Neste artigo, originariamente preparado para a Conferência “Trends and Challenges of Urban Restructuring”, realizada no Rio de Janeiro em 1988, o autor, com base na informação empírica disponível, analisa as características do processo de urbanização no Brasil depois da II Guerra Mundial e explora as tendências desse processo para as próximas décadas. Enfatiza, nessa análise, os problemas e particularidades da constituição de uma sociedade urbanoindustrial complexa, porém pobre e desigual, na periferia do mundo capitalista.
A “Teoria da dependência”, paradigma dominante entre os economistas não-neoclássicos de 1960 até o fim dos anos 70, tem sofrido um discreto mas rápido processo de desgaste nos dez últimos anos, até ter desaparecido quase que completamente da agenda dos pesquisadores. Apesar das homenagens e do prestígio que conservam os fundadores1, a unanimidade em torno do quadro conceitual explodiu, os enfoques mais diversos surgiram, todos rejeitando explícita ou implicitamente as análises tradicionais em termos de “Centro” e “Periferia”. Entre essas novas temáticas adotadas pelos atuais estudiosos da dinâmica dos sistemas econômicos, se destaca certamente a da “informalidade”.
Resumo
Este trabalho pretende refletir sobre as razões, alegadas e reais, dessa mudança generalizada de enfoque: a(s) velha(s) teoria(s) falharam? Foram incapazes de se adaptar aos desdobramentos do novo contexto mundial dos anos 70 e 80? Ou apenas perderam seu poder mobilizador sob o impacto da onda ideológica neoliberal dos anos 80, sem perder seu valor científico?
Num discurso de 1980, pronunciado por ocasião do Prêmio Adorno, que a cidade de Frankfurt lhe concedia, Habermas aborda a estética do ponto de vista de sua autonomização, ou seja, do abandono progressivo de suas tutelas extra-estéticas, até o ponto em que as vanguardas de nosso século se liberam de qualquer referência (p. 951). Desde então a filiação da arte não é senão a de uma atualidade a outra atualidade: expulsa para o passado pela atualidade surgida do presente conforme a dinâmica do novo, e que resulta de uma oposição abstrata ao processo histórico.
Resumo
A condição de existência da arte moderna é assim o sobrelance permanente, amparado pela consciência de uma irreconciliação que culmina necessariamente no isolamento de uma esfera autônoma inacessível. Daí o fracasso das vanguardas. Esta não é uma posição isolada e — notadamente na Alemanha, já há uns quinze anos, com H.R. Jauss, J. Habermas,
A. Wellmer — ela postula como proposta de superação da estética negativa de Adorno uma reativação da comunicação entre as obras de arte e sua recepção cotidiana.
Debate entre Luiz Felipe Alencastro, Francisco de Oliveira e Roberto Schwarz. A idéia de realizar e publicar esse debate em torno do livro Um Mestre na Periferia do Capitalismo – Machado de Assis, de Roberto Schwarz, explica-se sobretudo pela tentativa de reconstituir, de um ponto de vista polêmico, a transdisciplinaridade contida nesse trabalho de crítica literária. Em lugar de procurar um consenso estrito acerca do livro de Roberto Schwarz, foi nossa intenção – como o leitor verificará a seguir – reunir pessoas que representassem não apenas diferentes disciplinas e áreas de interesse, mas também posições diferenciadas e, por vezes, conflitantes. É bem verdade que, por essa via, nos livrávamos, ao mesmo tempo, de uma dificuldade que frequentemente tem impedido que Novos Estudos adquira uma feição mais polêmica: a escassez de intelectuais dispostos a discutir num nível que supere as simples idiossincrasias bem como a bajulação fácil.
Os tempos de Bertolt Brecht e Hannah Arendt (1955), marcados pelo nazismo e o estalinismo, foram “tempos sombrios”. Cinquenta anos depois vivemos tempos incertos, marcados pela superação de velhas crenças e pela confusão ideológica. Hirschman (1982) nos fala dos ciclos políticos, através dos quais as gerações em um momento se dedicam ao interesse público, para em seguida, frustradas ou desencantadas, voltarem-se para seus interesses particulares.
Resumo
Se os tempos são incertos em todo o mundo, mais incertos são eles para o Brasil, que vive uma crise econômica — na verdade uma crise fiscal do Estado — sem precedentes, que deixa suas melhores inteligências sem perspectivas, se não sem esperança. O governo Collor enfrenta esses tempos incertos com a bandeira da modernidade e do mercado. Em função disto Collor e seu governo são identificados com o neoliberalismo, que, no campo da ação política, teve no thatcherismo sua expressão mais clara.
Pesquisas de intenção de voto tornaram-se parte do dia-a-dia das campanhas eleitorais no Brasil, particularmente nos anos 80. Se após o golpe militar de 64 a supressão das eleições para os principais cargos executivos e o clima político não favoreciam a prática da pesquisa, a retomada gradativa do calendário eleitoral trouxe novo fôlego à área. Como consequência, é claro, acendeu-se a polêmica sobre o assunto.
Resumo
Pesquisas indicam erros e acertos nas táticas de campanha, redirecionam estratégias, incentivam desistências, forçam alianças, fornecem elementos para programas de governo e alteram a agenda dos candidatos. Além disso, em certos momentos chegam a ofuscar os atores principais nos espaços da mídia, pela repercussão da “disputa” paralela entre os produtores de dados. Por tudo isso, as pesquisas não podem mais ser vistas como figurantes no cenário eleitoral.
Crítica: Livros “Picasso Criador”, Pierre Daix, Porto Alegre, LPM Editores, 1989, “Picasso Criador e Destruidor”, Arianna Stassinopoulos Huffington, S. Paulo, Best Seller, 1988; “Minhas Galerias e Meus Pintores”, depoimentos de Daniel-Henry Kahnweiler a Francis Crémieux, Porto Alegre, LPM Editores, 1990; “Autobiografia de Alice B. Toklas”, Gertrude Stein, Porto Alegre, LPM Editores, 1984.
Resumo
Felizes são os biografados. Suas vidas se desdobram pacientemente em função de metas claras, sempre capazes de enfrentar momentos adversos e de antever o curso das coisas, sem nunca precisarem indagar sobre o sentido de seus gestos. Enquanto os mortais nos debatemos para conhecer a extensão de nossos atos, os biografados seguem uma trilha segura, garantia de que não se está sempre no mesmo lugar.
Parte quase insubstituível, o retrato vem sendo o legitimador e faz parte da publicidade do casamento. Não só torna pública uma relação como, com o passar do tempo, acaba se confundindo com a lembrança do próprio casamento.
Resumo
O retrato de casamento passou a ser um ritual complementar ao rito de passagem — casamento —, quase desde os primórdios da invenção e difusão comercial da técnica fotográfica. O retrato registra a mudança de status, principalmente da noiva, mas também das famílias de origem, e em inúmeros casos substitui o ritual completo, que vem perdendo o conteúdo sagrado e se adequando a novos significados sociais. O estudo de fotos de casamento de famílias tradicionais, de famílias de imigrantes de diferentes origens, rurais e urbanas, de vitrines de fotógrafos ou de biografias de fotógrafas revela a permanência desse ritual, ainda que com novos significados e como uma substituição parcial do antigo ritual do casamento.
Como um dos principais ritos de passagem, o casamento encontrase em quase todas as sociedades e simboliza uma alteração irreversível da situação social do casal que, proveniente de duas famílias ou de dois ramos da família, une-se para formar uma terceira. Em grande parte, o casamento está mais ligado à passagem da moça donzela a esposa e anjo tutelar de nova linhagem. Em muitas sociedades, o casamento corresponde à passagem à maturidade, à vicia adulta da mulher.
Enquanto esteve na Bahia, Vieira conviveu intimamente com os cristãos-novos, desde os mais simples até os mais ricos homens de negócios, datando daí a sua amizade com o rico mercador e financista do Rei D. João IV, Duarte da Silva, cristão-novo, que desempenhou, do ponto de vista financeiro, importante papel durante a luta com a Espanha pela restauração da casa de Bragança. Em 1641, o padre Vieira deixou o Brasil, tornando-se, em Portugal, diplomata e conselheiro do novo Rei. Seu convívio com os judeus portugueses, em diversas capitais européias, fê-lo entender a importância para seu país de uma aliança com os ricos mercadores e financistas cristãos-novos.
Resumo
Durante os anos em que representou Portugal nas cortes européias, o padre Vieira teve a ocasião de encontrar, na Holanda e na França, portugueses judeus que se haviam expatriado, com os quais não só discutia assuntos políticos de comum interesse, como questões filosóficas e de religião. Sua “Proposta” sobre a abolição do confisco dos mercadores cristãosnovos que fossem presos pela Inquisição, e que culminou com a publicação de um Alvará no ano de 1649, é bastante conhecida.
Nos últimos anos surgiu uma literatura considerável sobre sistemas eleitorais nas democracias ocidentais avançadas (Bogdanor e Butler, 1983; Grofman e Lijphart, 1986; Katz, 1980; Lijphart, 1988; Nohlen, 1981). Embora os analistas de sistemas eleitorais discordem acerca de muitas questões, há também alguns pontos consensuais importantes. E o mais importante, eles concordam em que os sistemas eleitorais têm peso, que não são simplesmente reflexo de clivagens sociológicas e políticas mais amplas na sociedade. Os sistemas eleitorais afetam as estratégias dos eleitores e dos políticos (Riker, 1986).
Resumo
A despeito da evidência de que os sistemas eleitorais são importantes, esse tema foi negligenciado no estudo da política latino-americana. Na última década, surgiu um “novo institucionalismo” no estudo da política latino-americana, acompanhando o novo institucionalismo no estudo da política norte-americana (ver March e Olsen, 1984). O número de estudos sobre eleições, partidos e outras instituições e a opinião pública aumentou, embora ainda reste muito a ser feito.
As disciplinas que compõem o terreno das chamadas humanidades, afora as questões determinadas por sua própria dinâmica interna, costumam ser impelidas a lidar, direta ou indiretamente, com as grandes questões de sua época e de sua sociedade. Isso, porém, evidentemente não se dá de maneira uniforme e o próprio comprometimento com determinadas questões afeta seu relacionamento com outras.
Resumo
No caso da Antropologia no Brasil, parece óbvio que o relativismo, ao mesmo tempo que resultado de uma trajetória de investigações e premissa de outras tantas, tem a ver com o papel público da Antropologia para além dos muros da academia. O relativismo e seus desdobramentos (sobretudo a valorização da diversidade), se não explicam totalmente
o sucesso de público da Antropologia, ajudam a entendê-lo.
Poemas.