O governo dos Estados Unidos destruiu o Tilted Arc em 15 de março de 1989. Exercendo direitos de proprietário, as autoridades da General Services Administration [Administração dos Serviços Gerais] ordenaram a destruição da escultura pública que sua própria repartição havia encomendado dez anos antes. A profanação final deu-se após cinco anos de distorções, falsas promessas, processos espetaculares na mídia e no tribunal, decepções que no fim não só permitiram ao governo destruir o Tilted Arc, como também estabeleceram um precedente para a prioridade dos direitos de propriedade sobre a livre expressão e os direitos morais dos artistas.
Resumo
Tão logo minha própria opinião sobre o destino da escultura foiirrevogavelmente recusada pelos tribunais federais, William Diamond, o administrador regional da GSA e o principal responsável pela campanha contra o Tilted Arc, tomou providências para que a escultura fosse removida. Numa sinistra sessão que varou a noite de 15 de março, equipes trabalharam horas extras para desmontar o Tilted Arc, brutalmente serrando a peça e cortando-a com maçarico.
As recentes e tão esperadas eleições presidenciais, com seu disputado desfecho mobilizaram intensamente, como não poderia deixar de ser, quase toda a população do Brasil. Gostaria de levantar algumas questões que estão mais diretamente ligadas à preocupação e a uma tradição de trabalho voltadas para a dimensão cultural, simbólica da sociedade brasileira. Com isto, quero deixar claro, não descarto outras análises e enfoques. Creio que é necessário considerar o conjunto de valores e atitudes que, de alguma forma, contribuíram para a vitória de Fernando Collor de Melo.
Resumo
É muito fácil explicar o voto das “camadas de baixa renda” em Collorcomo sinal de ignorância, atraso ou alienação. Deve-se, primeiramente,assinalar que encontramos na História do Brasil uma longa galeria depersonagens que desemboca no presidente eleito. São os heróis salvadores,tocados por carisma, que mobilizaram, cada qual em circunstânciasespecíficas, a paixão e admiração de vastos setores da sociedade nacional.
Há um consenso acerca do fato de que o Brasil só retomará o crescimento se os problemas de estabilização forem superados. Ou seja, é preciso estabilizar para crescer. Por outro lado, persistindo a performance medíocre de crescimento dos anos 80 (2% em média no período 1980/89), será difícil pensar numa melhoria da distribuição da renda. Neste sentido, é preciso crescer para distribuir.
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Se o governo Collor, ou qualquer outra administração, pudesse se ater exclusivamente às prioridades acima, não haveria muita dúvida quanto à seqüência da ação: estabilizar-crescer-distribuir pareceria a ordem natural das coisas. Contudo, os sintomas de que o problema é mais complexose manifestam logo no ponto de partida. Como estabilizar? Programasde estabilização de diversos matizes foram encetados sem sucesso nos últimosdez anos. Uma inflação média anual superior a 200% no período 1979/89 e a estagnação da renda per capita ao nível de 1979/80 atestama sucessão de frustrações na tentativa de deter a inflação e retomar ocrescimento.
Tudo indica que está encerrado o ciclo daquilo que Mario de Andrade chamou de “atualização da inteligência artística brasileira”, por ele considerada um dos princípios fundamentais do movimento modernista. Pode parecer estranho falarmos em fim de um princípio que é sinônimo da renovação constante e vital da criação artística e que configurou um dos momentos mais inconformistas da integração brasileira à modernidade literária.
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No Modernismo a atualização implicou um contato com o público no sentido de provocar estranhamento e revolucionar a sensibilidade, os modos de pensar e as formas de representação, de alterar convenções de beleza e padrões de gosto, enfim, foi fator decisivo na luta contra os valores estabelecidos pela tradição e pelo academicismo. Hoje ela deixou de ser um critério aplicável com força de lei à produção cultural, pois não se exige da arte e da literatura que sejam porta-vozes e mediadoras da informação atualizada, nem este atributo por si só é suficiente para justificá-las.
Na Praça Vermelha, o ritual da visita ao túmulo de Lênin é o mesmo há décadas. Quando o clima permite, no imenso vão aberto entre o Kremlin, o Museu da Revolução, o Gum e a Catedral de São Basílio, forma-se uma fila interminável e pachorrenta. Os turistas são poucos. Soviéticos – com freqüência famílias inteiras – esperam, pacientes, a sua vez de dar uma rápida espiada no corpo embalsamado do líder da Revolução de Outubro.
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A conseqüência foi um extraordinário atraso da URSS em face do Ocidente desenvolvido, que, no mesmo período, passava por um notável processo de modernização econômica, apoiado na ampla utilização de novas tecnologias. Ao visitante estrangeiro causa espanto o atraso de muitos aspectos do dia-a-dia da sociedade soviética.
Dentre as antigas fotografias que guardo comigo, há uma que me fascina por seu caráter simbólico, oculto a olhos alheios: meu pai está no mar, só, naquela imensa superfície de água, tendo ao fundo, à distância, uma rocha. A foto é datada de 1927, quando meu pai, Lev Kamenev, era embaixador soviético em Roma. Nunca fiquei sabendo quem bateu aquele instantâneo. Talvez o filho de Máximo Górki, em cuja casa, em Capri, meus pais estavam hospedados. Foi dali que o conduziram a Moscou, onde foi preso pela primeira vez.
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Meus pais casaram-se em 1926. Minha mãe, Tatiana Glebova, era uma mulher inteligente e culta. Terminou os preparatórios em Tver, hoje Kalinin, importante cidade industrial situada na parte alta do Volga. De lá foi para a Escola de Artes e, em seguida, para o Instituto Eletrotécnico de Moscou. Ingressou no Partido Bolchevique em 1916, quando contava 20 anos de idade. Em 1917 participou da Revolução de Fevereiro e da Grande Revolução Socialista de Outubro. Na primeira metade da década de 20 chefiou o departamento feminino do Soviet de Moscou.
O resultado do segundo turno das eleições presidenciais, se decepcionou, a rigor não surpreendeu. O marajá superkitsch, já empossado ou prestes a isso, exibiu imediatamente após a vitória, entre Seychelles, Luxor e o inevitável eixo Roma-Paris, com as adjacências dos “chateaux de la Loire”, o que já parece ser sua marca registrada: a arrogância de fazer-se ver gastando, esnobando, frente à massa faminta que nele votou.
Sei que esse título parece pretensioso. Mas a razão dele é exatamente sua justificativa. Desde o século XIX, o pensamento ocidental jamais deixou de dedicar-se à tarefa de criticar o papel da razão – ou da ausência de razão – nas estruturas políticas. Por isso, é perfeitamente despropositado empreender uma vez mais um projeto de tal envergadura. Não obstante, o fato de haver tantas tentativas anteriores é em si mesmo uma garantia de que toda experiência nova nesse sentido irá encontrar o mesmo sucesso das precedentes – de todo modo, que provavelmente terá o mesmo êxito.
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Uma das tarefas do Iluminismo era multiplicar os poderes políticos da razão. Mas os homens do século XIX não tardaram a perguntar-se se a razão não estava ficando excessivamente poderosa em nossas sociedades. Começaram a preocupar-se com a relação, confusamente percebida, entre uma sociedade propensa à racionalização e determinadas ameaças ao indivíduo e suas liberdades, à espécie e sua sobrevivência.
A revolta de Pequim de 1989 prendeu a atenção mundial, mas a enfermidade que provocou a emergência é mais ampla e profunda do que qualquer de seus slogans manifestos pode sugerir. Para estrangeiros que moram em Pequim, como eu, já estava claro nove meses atrás, quando se ouviam as queixas dos intelectuais, estudantes e cidadãos comuns fora da vida oficial, que mais uma crise chinesa moderna estava a caminho. As pessoas estavam zangadas, deprimidas e confusas. Os intelectuais, mesmo aceitando amplamente o dever confuciano de “preocupar-se em primeiro lugar” com seu país e não consigo mesmos, estavam em particular extremamente melancólicos e francamente descrentes de que algo importante pudesse ser feito.
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Os intelectuais haviam tentado se envolver antes. Muitos haviam se lançado idealisticamente na revolução no começo dos anos 50 apenas para terem suas boas intenções cruelmente traídas — “nossos dorsos quebrados, nossos cérebros descartados” — em campanhas antidireitos do final daquela década. Humilhados terrivelmente durante a Revolução Cultural no final dos anos 60 e início dos 70 (imagine-se sendo informado de que você teria de pagar pela bala que tinha “executado” seu filho adolescente), eles de algum modo reuniram seu otimismo patriótico novamente no final dos anos 70. As “reformas” de Deng Xiaoping, esperavam eles, poderiam verdadeiramente, e por fim, colocar a China no caminho certo.
Ultimamente, quando conversamos sobre a situação política recolhemos uma impressão de estranheza. Diante dos resultados da eleição presidencial tão desejada, gerou-se uma certa perplexidade que para alguns fundamenta uma desilusão, e para outros cria uma certa ansiedade. Que país é este que dá a vitória a Collor, jovem impetuoso, apoiado em poucos assessores e sem definições claras sobre seu programa de ação?
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Diante desta pergunta que inquieta a todos, alguns procuram a resposta enfatizando as relações do candidato vencedor com interesses empresariais ou com políticos conservadores. Outros, impressionados com seu desempenho de campanha, dão-lhe um crédito de confiança baseado na esperança de que ele venha a ser o paladino da moralidade e da modernização.
Está em discussão desde finais de novembro, quando foi publicado, o projeto de lei sobre a propriedade na URSS. Esta lei faz parte de um conjunto de instrumentos, que se pretende consistente, para a institucionalização das bases da reforma econômica no país1. Mas é, sem dúvida, a que desperta maior interesse, porque diz respeito aos fundamentos do sistema, e porque surge quando a reforma do mesmo, em outros países do bloco socialista europeu, particularmente Polônia e Hungria, acelera-se notavelmente, dando lugar, juntamente com a derrubada do Muro de Berlim, a uma acentuação da discussão acerca de um retorno ao capitalismo.
Resumo
Não se trata, desta vez, de simplesmente descentralizar o processo decisório ou de introduzir indicadores de desempenho para estimular o crescimento da produção e/ou a melhoria de qualidade dos produtos. Trata-se de uma mudança no modo de funcionamento do sistema, de uma modificação do sistema de gestão que altera substancialmente a natureza do planejamento central e as relações entre as empresas e entre estas e os órgãos centrais de administração econômica.
PRIMEIRA: NA CIDADE. À espera dos bárbaros O que esperamos no ágora reunidos? É que os bárbaros chegam hoje. Por que tanta apatia no Senado? Os senadores não legislam mais? É que os bárbaros chegam hoje. Que leis hão de fazer os senadores? Os bárbaros que chegam as farão.
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Este poema de Constantino Cavafis, escrito nos primeiros anos do século XX, é seco e preciso, sem qualquer ênfase ou mesmo vislumbre de emoção. Ele manifesta uma aspiração contida à catástrofe, exprimindo o dilaceramento contraditório que pode assaltar as consciências e as civilizações. Dilaceramento cujas raízes vêm talvez do período romântico, onde avultaram tanto na literatura a divisão da personalidade, o sadomasoquismo e o gosto da morte no plano individual. No plano social, a vertigem da ruína e a certeza de que as nações morrem, como os indivíduos.
Cultura política. O que significa essa expressão? Se fosse apenas uma questão de alfabetização política do povo, ou de consciência política, ou do genuíno interesse do povo pela política, ou da compreensão dos fatores que se processam dentro da sociedade, seria mais apropriado falar de “cultivo da política”. Se, porém, examinarmos a questão a partir de perspectiva mais ampla, não poderemos deixar de fazer uma descrição das formas pelas quais as instituições políticas da sociedade foram planejadas e pelas quais funcionam, nem da forma pela qual o povo participa da vida política.
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Durante o período da história soviética marcado por uma total ausência de glasnost, nossos compatriotas intelectuais exasperaram-se particularmente diante da impossibilidade de analisar a vida política do país, bem como de dizer a verdade sobre quem somos, o que estamos construindo e para onde nos dirigimos.
O governo de Fernando Collor de Melo tem início sob a mais ansiosa expectativa de toda a nação. Seria surpreendente se assim não fosse pois, afinal, o país vive a mais profunda crise econômica de sua história. Como se não bastasse, este é o primeiro presidente eleito depois de 29 anos e, talvez mais do que tudo, a falta de um programa de governo explícito, a ausência do então candidato nos debates, as mudanças de rumo no seu programa eleitoral e o apoio que recebeu de setores tão díspares como a Fiesp e os “descamisados”, tornaram seu governo um enigma que todos querem decifrar.
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Após a eleição, sua atuação contribuiu pouco para esclarecer qual o rumo que tentará dar ao país, tornando a maior parte das análises um exercício de futurologia. Entretanto, em meio a este quadro de expectativas e de indefinição, a empáfia do novo presidente e sua postura de boxeador confiante entrando no ringue sensibilizam até mesmo os mais céticos.
A consciência revolucionária de 1789 é o lugar de origem de uma mentalidade marcada por uma nova consciência do tempo, um novo conceito do prática política e uma nova representação do que seja legitimação. Especificamente moderna é a consciência histórica que rompe com o tradicionalismo de continuidades naturalmente dadas; é a compreensão da prática política sob o signo da autodeterminação e auto-realização; e é a confiança no discurso racional no qual todo domínio político deve legitimar-se.
Resumo
Nos centros urbanos delineiam-se os contornos de um trânsito social marcado simultaneamente por formas de expressão socialmente diferenciadas e estilos individualizados de vida. Não se sabe ao certo se nessa “sociedade da cultura” espelha-se tão-só a “força do belo mal-utilizada” para fins comerciais ou de estratégia eleitoral, uma cultura de massas privatizada, semanticamente depurada — ou se ela poderia representar o campo de ressonância de um espaço público (Öffentlichkeit) revitalizado, onde brota a semente das idéias de 1789.
Logo depois das eleições um assessor de Fernando Collor de Mello se perguntava, com certo espanto, como fora possível que um pequeno grupo de políticos de Alagoas chegasse a tomar a Presidência da República. Como que o Estado brasileiro se tornou um objeto de assalto a ser conquistado por um condottiere, cercado por um bando de aventureiros que souberam substituir a força das armas pelo tráfico de esperanças?
Resumo
Um ano atrás quem prognosticasse que um obscuro governador de Alagoas chegaria à Presidência da República seria objeto de riso. O eixo da política girava em torno do triângulo São Paulo-Rio-Minas, epicentro da crise econômica e social, por conseguinte dele havendo de sair uma solução que resolvesse conflitos e organizasse aqueles interesses que fossem capazes de imporem-se como o próprio interesse nacional. O jogo político chegara a uma soma zero, paralisado por seus conflitos internos.