Ao reunir as notas seguintes sobre “A Literatura do Terceiro Mundo na Era do Capital Multinacional”, de Fredric Jameson, vejo-me numa posição incômoda. Se eu fosse nomear o crítico/teórico literário escrevendo atualmente nos Estados Unidos por cujo trabalho tenho em geral a mais alta estima, seria sem dúvida Fredric Jameson.
Resumo
Há sem dúvida um lado pessoal, um lado como que existencial em meu encontro com esse texto, que seria melhor esclarecer logo de início. Há cerca de quinze anos que venho lendo a obra de Jameson, e pelo menos parte do que conheço a respeito das literaturas e culturas da Europa ocidental e dos Estados Unidos vem dele; e, sendo eu um marxista, sempre nos considerei, Jameson e eu, como farinha do mesmo saco, embora nunca tenhamos propriamente feito um bolo juntos.
Acreditava-se que tudo já havia sido dito sobre o nazismo de Heidegger, especialmente depois dos estudos de O. Poggeler na Alemanha e de Fr. Fédier e Ph. Lacoue-Labarthe na França. O fato de o livro recente de Victor Farias sobre Heidegger e o Nazismo provocar há algumas semanas discussões apaixonadas num círculo bem mais amplo que o dos filósofos consegue ao menos demonstrar que o debate ainda não está encerrado.
Resumo
Há, evidentemente, o problema, já largamente debatido antes dele, sobre o nazismo de Heidegger, sobre sua realidade, seu sentido, sua dimensão em relação à obra do filósofo. Mas há também duas outras questões, mais novas, que este livro, devido ao seu caráter específico e à sua data, tem o mérito involuntário de levantar. Qual o estatuto ético, em relação aos nossos juízos costumeiros sobre a inquisição e a censura, de um livro que se apresenta abertamente como um empreendimento de denúncia, em particular, de denúncia de um pensador, sobretudo quando esta denúncia é em grande parte caluniosa?
Estudantes alemães! A revolução nacional-socialista traz a completa reviravolta de nosso Dasein alemão. Vossa tarefa é de permanecer, no que está para vir, os que vão sempre à frente e se mantêm a postos, os que são obstinados e que crescem sempre. Vossa vontade de saber busca a experiência do essencial, do simples e do grandioso. Vós aspirais expor-vos à ameaça mais imediata e ao maior dever. Sede fortes e autênticos em vossa exigência. Permanecei lúcidos e firmes na recusa.
Resumo
Não desviai o saber conquistado na dura luta para fazer dele uma vã posse pessoal. Preservai-o como a posse original necessária ao homem que dirige colocado nas profissões populares do Estado. Vós não podeis mais limitar-vos a ser somente “os que escutam”.
Um liberalismo econômico enragé anda em moda. O fracasso da administração Sarney e o caráter errático da política econômica transmitem desconfiança em relação à gestão pública, transferindo ao Brasil a consigna do conservadorismo internacional: menos governo!
Resumo
O privatismo e o antiestatismo, anteriormente temas difusos em um empresariado marcado pelo clientelismo, agora emergem como a tônica do discurso conservador. Em paralelo, revitaliza-se um certo tipo de elogio à iniciativa empresarial e ao espírito empreendedor dos capitalistas privados (em contraste com a ineficiência da administração pública), que acaba transformando em lema uma palavra de sentido impreciso: o mercado.
Se entendi bem, a principal objeção de Luiz Antonio de Castro Santos à formulação muito esquemática que tentei dar ao problema do Positivismo no Brasil, poderia ser resumida mais ou menos nos seguintes termos: deixando de lado o decalque doutrinário dos irredutíveis do Apostolado, não é verdade que o ideário positivista, encarnado sobretudo pelos heterodoxos e pragmáticos comtianos paulistas, tenha corrido por uma pista inexistente e ainda por cima com o sinal trocado; pelo contrário, o que mais ressalta nesse grupo é a perfeita “sintonia com os interesses materiais da república oligárquica”, superlativamente espelhados nos princípios da Filosofia Positiva, verdadeiras armas de campanha com que “municiaram a nascente elite agrário-exportadora e industrial”.
Resumo
Se isso fosse inteiramente verdade, a história intelectual do Brasil perderia metade do seu interesse — para dizer o menos —, sobretudo o comparativo, e toda a sua graça, que não reside por certo no exotismo, mas na ironia ao quadrado em que se resolve nossa sempre lembrada (por Paulo Emilio) incompetência criativa em copiar. O que fazer? Como não
posso me explicar por extenso, concentro-me num traço fisionômico da figura do Dr. Pereira Barreto, em torno da qual gira o argumento de Luiz Antonio em favor da vida à européia que o Positivismo levou no Brasil.
Em seu recente artigo sobre o Positivismo no Brasil, Paulo Eduardo Arantes discute a tese de Paul Arbousse-Bastide – um dos mestres franceses dos primeiros tempos da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Paulo -, segundo a qual a doutrina de Comte encontrou em nosso país “sua verdadeira pátria”, um campo mais propício (que a França) para desenvolver-se plenamente, no final do século passado e princípio deste.
Resumo
Como se sabe, eram múltiplos os sinais do vigor do Positivismo tropical, divisados por Arbousse-Bastide e por outros que compartilhavam sua tese. Por exemplo, as idéias positivistas teriam contribuído para o fim de um regime político e para o surgimento de outro (figuras centrais como Benjamin Constant Botelho de Magalhães, entre outros, foram ministros ou “fundadores” da República);
Poesias de Francisco Alvim (Mula; Filho e Pai; Mente). Conto de Vilma Arêas (Boquinha)
A ideologia que orienta a atual ofensiva de direita é em vários sentidos um fantasma dos anos 20: antiestatista, enfatizando a hegemonia empresarial, retratando o consumo popular como inimigo dos interesses nacionais, e baseada na crença na racionalidade do mercado e na importância autônoma da moeda. Entretanto o que é novo nessa ideologia é o papel dominante desempenhado pela teoria econômica técnica.
Resumo
Nos anos 20, as políticas antiinflacionárias e os princípios do padrão-ouro e do equilíbrio orçamentário se justificaram como um conhecimento acumulado a partir da experiência. A única base teórica para esses princípios era a teoria quantitativa da moeda. Seu apelo ideológico se expressava em termos de valores populares, tais como frugalidade, responsabilidade e senso comum.
Próspero Morse se olha no espelho da América Ibérica, e pouco a pouco a imagem refletida vai entrando em foco. Por trás da nuvem espessa de Estados nacionais frustrados, etnias e sociedades desgarradas, caudilhos grotescos e trágicos, insurreições que terminam em sangue e desespero, projetos abortados de modernização e industrialização, parece ser possível vislumbrar uma realidade mais sólida, uma verdade mais profunda, e, ao mesmo tempo, a razão do equívoco do espelho: a América Ibérica está desfocada porque ela se contempla no espelho da próspera América inglesa e, na busca inútil da imitação do outro, perde sua própria essência.
Resumo
Se os latinos olhassem melhor, no entanto, talvez vissem que existe uma outra imagem do mundo próspero, a imagem daqueles que, como Morse, se desesperam e conseguem até zombar das aflições e mesquinharias de seus compatriotas, de sua obsessão com as coisas miúdas e materiais, e transcender sua falta de sentido histórico, seu desprezo pelas questões de espírito e sua aridez.
Eu desenvolvo aqui uma análise do estado de bem-estar contemporâneo nas democracias industriais avançadas. A tese central é que os estados de bem-estar maduros têm suas estruturas e benefícios entrelaçados às estruturas sociais que eles próprios remodelaram. Isso torna difícil desmontar ou reduzir estados de bem-estar mesmo quando governos da persuasão ideológica de Margaret Thatcher ou Ronald Reagan chegam ao poder.
Resumo
Levando em consideração algumas variações entre países, a divisão entre Estado e economia é muito menos nítida do que no século XIX ou no período pré-1945. Entretanto, os estados de bem-estar não constituem simplesmente um novo estágio do desenvolvimento capitalista e do nível de intervenção estatal, mas uma reestruturação mais fundamental desses países. Através de um exame da forma contemporânea dos estados de bem-estar e das estruturas sociais é possível lograr uma melhor compreensão dos recentes acontecimentos políticos, inclusive o advento de governos ideologicamente conservadores.
A poesia de Chico Alvim consiste num improviso. Mas onde está, o que é, este improviso? Acontece que uma das formas sutis do improviso é ceder a vez. Ceder a voz. Desocupar o espaço para a palavra alheia. Ouvir de tudo, mas exercer o direito de selecionar e medir. Aprender a ceder a vez, sendo atitude prudente e sábia, é ainda uma técnica, uma maneira de se obter o poema.
Resumo
Quem é que poderia imaginar que a poesia está, por exemplo, no monólogo suposto de uma prostituta, que um belo dia sente-se paralisada, os sentimentos íntimos predominam sobre a rotina profissional, e ela cai em melancolia reflexiva e poética? Mais uma vez, alguém descobre a pólvora: Chico vai buscar a poesia que existe na voz dos deserdados, dos que não deram certo, dos dilacerados, dos aparentemente realizados. E essa voz particular, relatando uma experiência alheia à nossa, acaba tendo uma continuidade dentro da gente.
Já há algum tempo se generaliza o sentimento de que “agora não dá mais”, “alguma coisa tem que acontecer”, “não dá para continuar com isso”! E, bem ou mal, com 24% de inflação ao mês, com escândalos, corrupção e mais problemas, a vida continua, o Brasil caminha e a esperada crise final não acontece. Até quando? Qual o limite? Será possível conviver ad infinitum com esta inflação e este desgoverno?
Resumo
A dificuldade de se entender politicamente e suportar emocionalmente a atual realidade brasileira é tão grande que começam a aparecer os que, cansados de esperar o caos, a hiperinflação ou qualquer fato novo, passaram a acreditar que “as coisas não são tão ruins”: o desemprego não está aumentando, o nível de atividade está razoável (pelo menos não há recessão), a balança comercial garante um belo superávit, que impede uma crise cambial maior, enfim, nem tudo está perdido.
Nas últimas cinco décadas, acelerada e abrangentemente, o que se chama Welfare State, como conseqüência das políticas originalmente anticíclicas de teorização keynesiana, constituiu-se no padrão de financiamento público da economia capitalista.
Resumo
Este pode ser sintetizado na sistematização de uma esfera pública onde, a partir de regras universais e pactadas, o fundo público, em suas diversas formas, passou a ser o pressuposto de financiamento da acumulação de capital, de um lado, e, de outro, do financiamento da reprodução da força de trabalho, atingindo globalmente toda a população por meio dos gastos sociais.
Desde a construção e o surpreendente êxito de público e crítica do Beaubourg, a França vem se empenhando em reassumir o lugar de Capital Internacional da Cultura. Em todo o século, os investimentos na área nunca foram tão vultosos. Simples ampliação – apenas mais aparatosa do que de hábito – do setor de serviços numa sociedade afluente? De qualquer modo não é usual esta subversão de prioridades num Estado capitalista, sobretudo num momento de crise generalizada. Trata-se, seguramente, de uma reorganização do capitalismo em outras bases, sobre as quais ainda pouco se sabe, e de cuja estratégia talvez faça parte uma tal reconversão.
Uma dessas manhãs eu ia da minha casa para a USP. Cheguei à Praça Panamericana pela pista da esquerda. Deparei com uma situação insólita nesta bendita cidade: ao passo que nas demais faixas os carros estavam parados, na que eu vinha havia uns 30 metros livres para continuar avançando. Fiz isso, mas um carro que se encontrava na faixa central saiu de repente para a esquerda, pela qual eu avançava, sem dar sinal com a mão ou a seta. Tive de brecar violentamente e, atrás de mim, tiveram de fazê-lo vários outros carros, com os conseqüentes guinchos e gritos de protesto.
Resumo
USP tem tido a boa idéia de colocar, perto da entrada de alguns prédios, espaços reservados para que pessoas com dificuldades físicas estacionemos os nossos carros. Chovia. Disse a mim mesmo que, como já aprendi, isso garantia que esses espaços não estivessem livres. Assim foi. Horas mais tarde, ao sair, encontrei uma pessoa em invejável estado atlético, entrando num dos carros estacionados em um desses espaços. Não resisti à tentação de lhe dizer que me parecia errado que impedisse o uso dos mesmos por pessoas que realmente necessitam deles.
Posso compreender muitas das reações de Aijaz Ahmad a meu ensaio sem que, ao fim e ao cabo, me abandone a sensação de que valeu a pena tê-lo escrito e de que valeu a pena ter dito essas coisas. O ensaio pretendia intervir numa situação literária e crítica do “primeiro mundo”, em que me parecia importante sublinhar a perda de certas funções literárias e de certos engajamentos intelectuais na cena americana contemporânea. Pareceu-me útil dramatizar essa perda mostrando a presença constitutiva dessas coisas — o que chamei alegoria narrativa (a saber, a coincidência da história pessoal e da “história da tribo”, como anteriormente em Spencer) e também o papel político da intelectualidade cultural — noutras partes do mundo.
Resumo
É claro que deve-se então retornar e mostrar que a literatura norte-americana também inclui suas próprias culturas do “terceiro mundo” (que escapam às categorias com as quais se descreve a cultura hegemônica); e é igualmente claro que não se pode pensar as culturas clássicas do Oriente (por exemplo) como culturas do terceiro mundo da mesma forma
que não se pode pensar o Renascimento inglês como uma cultura do primeiro mundo.