"Judicialização da política": Déficits explicativos e bloqueios normativistas
José Rodrigo Rodriguez, Marcos Nobre
Resumo
Nosso objetivo com este texto é mostrar as limitações de uma concepção formalista do direito, calcada na gramática clássica do direito burguês. Isso se faz necessário, a nosso ver, porque essa concepção mostra uma persistência na teoria e na pesquisa social – na brasileira, em especial – que bloqueia, a nosso ver, uma adequada compreensão do direito, entendido tanto em seu sentido de fenômeno social quanto como uma das disciplinas das ciências humanas.
É evidente que tal persistência não é casual e merece ser investigada por si mesma. Esse não é, entretanto, nosso objetivo aqui. Limitamo?nos a dar indicações nesse sentido. Para o caso dos países centrais — em especial para aqueles de tradição jurídica romano?germânica, mas não só —, pensamos que essa persistência se deve à hegemonia ideológica do neoliberalismo nas últimas décadas, cuja visão tradicional do direito se apoia em interesses tão simples e diretos quanto a defesa intransigente de concepções tradicionais do direito de propriedade, das regras de mercado e de um Estado mínimo. Para o caso do Brasil, a hipótese é que, em vista do longo período de governos autoritários e/ou coronelismo ao longo do século XX, o próprio direito burguês aparece como padrão e como novidade, obscurecendo a visão das profundas transformações pelas quais passou o direito ao longo desse mesmo século. Não por último, pensamos mesmo que as transformações atuais tendem a se dar em um sentido bastante diferente do “direito social” do século passado. Mas, como dito, não é nosso objetivo desenvolver em detalhe essas indicações neste texto; ainda que seja necessário apontar desde o início elementos que são importantes pontos de apoio de nosso diagnóstico do tempo presente.
Opinião / Opinion
"Judicialização da política": Déficits explicativos e bloqueios normativistas
"Judicialização da política": Déficits explicativos e bloqueios normativistas
Em discurso de agradecimento, o professor e crítico literário relembra sua trajetória intelectual. Do contato e amizade com figuras-chave da geração precedente de intelectuais aos passos de sua carreira de crítico e acadêmico, passando por memórias pessoais, o texto reconstrói o pano de fundo pessoal e intelectual do autor.
Queridos alunos e ex?alunos, queridos amigos, senhoras e senhores,
Durante todo o tempo que precedeu esta cerimônia, desde o anúncio da entrega deste título, procurei driblar, de diversos modos, a emoção; espero poder driblá?la de novo agora, por meio da palavra escrita e da leitura. Como sabem meus alunos, não costumo escrever o que falo, mas me senti obrigado a fazê?lo, a fim de domar o que talvez não pudesse conter.
Esta entrevista enfoca a derrubada do regime autoritário egípcio em 11 de fevereiro de 2011, quando o presidente Hosni Mubarak renunciou ao posto após três décadas no poder: as razões que levaram à revolta popular, os segmentos sociais que compuseram o movimento e a forma como se deu sua mobilização, as forças que constituíam a estrutura de poder do regime deposto, o cenário sociopolítico do Egito no período de transição subsequente e as perspectivas de democratização do país.
Ao longo dos últimos anos, uma rebelião estava fermentando sob a superfície. Havia uma sensação geral de que o status quo era insustentável. Filmes, romances e canções eram permeados pelo tema da revolta: ele estava disseminado no imaginário da população. Dois processos foram determinantes para fazer com que egípcios apolíticos, convencionais, sentissem que já não podiam seguir tocando suas vidas normais. O primeiro foi a dissolução do contrato social que regulava as relações entre Estado e sociedade desde o golpe de Nasser nos anos 1950. Em paralelo a essa mudança social, e associada a ela, houve uma alteração nas formas de repressão política empregadas pelo regime.
O berlusconismo não é o fascismo, mas é o equivalente funcional e pós?moderno do fascismo. Implica a destruição da democracia liberal nas condições do novo milênio, na época do domínio da imagem, da globalização das mercadorias e da manipulação irrestrita da verdade.
A Itália de Berlusconi não é o fascismo. A ditadura proprietária do cavalier Berlusconi não é a ditadura política do cavalier Mussolini. O fascismo foi, acima de tudo, violência paramilitar. Bandos armados que ateavam fogo às sedes dos sindicatos, dos partidos de esquerda e das “casas do povo”, agrediam personalidades (mesmo católicas reformistas), espancando?as brutalmente e obrigando?as a beber óleo de rícino, somando a humilhação à violência. Piero Gobetti, jovem escritor?editor liberal, que dialoga com o Gramsci teórico dos “conselhos de fábrica”, morre logo após os espancamentos.
Resenha de Nova História em perspectiva, de Fernando Novais e Rogerio Forastieri da Silva (orgs.).
Resumo
Certa vez, em meio a uma reunião científica, foi sugerida a um alto gestor público a extinção dos cursos de mestrado no Brasil. A ideia partiu de um colega da área tecnológica, físico ou químico, não recordo bem. “Para que mestrados? É pura perda de tempo! Deveríamos selecionar nossos alunos diretamente para o doutorado!”, argumentou incisivo o colega. A resposta não tardou. O alto funcionário contestou na lata que, com as devidas exceções, as graduações brasileiras são muito ruins. Ao que, acrescentou, as pós?graduações do país eram legalmente soberanas para tornar obrigatórios ou não os mestrados como etapas da formação de seus alunos.
Certa vez, em meio a uma reunião científica, foi sugerida a um alto gestor público a extinção dos cursos de mestrado no Brasil. A ideia partiu de um colega da área tecnológica, físico ou químico, não recordo bem. “Para que mestrados? É pura perda de tempo! Deveríamos selecionar nossos alunos diretamente para o doutorado!”, argumentou incisivo o colega. A resposta não tardou. O alto funcionário contestou na lata que, com as devidas exceções, as graduações brasileiras são muito ruins. Ao que, acrescentou, as pós?graduações do país eram legalmente soberanas para tornar obrigatórios ou não os mestrados como etapas da formação de seus alunos.
Negativo e ornamental: Um poema de Carlito Azevedo em seus problemas
Iumna Maria Simon, Vinicius Dantas
Resumo
O estudo reconstitui as estratégias compositivas de um poema de Carlito Azevedo, “Na noite física” (1996), que glosa e incorpora um poema sem título de Charles (1985). As transformações revelam a trama intertextual de um poeta contemporâneo em que a erotização textual se sobrepõe à sua matéria, cuja violência fica sugerida. Discute?se o problema da isenção do sujeito produzida pela dissolução referencial, principalmente a estetização decorrente de um espetáculo verbal feito com os elementos anti?ilusionistas da poesia moderna.
Ainda não se escreveu uma história da intertextualidade na experiência recente da poesia brasileira em que se diferenciem as várias práticas de apropriação, glosa e crítica dos materiais da tradição. Tampouco se registrou como essas práticas se modificaram ao correr do tempo — das sabotagens textualistas dos anos 1960, quando demonstravam inspiração materialista, até a institucionalização retradicionalizadora dos anos 1990, quando, veículo de idealizações, patrocinaram uma espécie de volta à literatura.
Artigos / Articles
Negativo e ornamental: Um poema de Carlito Azevedo em seus problemas
Negativo e ornamental: Um poema de Carlito Azevedo em seus problemas
O artigo oferece uma visão panorâmica do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003?10) e analisa a trajetória política, social e econômica brasileira nas duas últimas décadas.
Ao contrário do conhecido ditado inglês, estoico ou pretensamente isento de culpa, nem toda vida política termina em fracasso. Na Europa do pós?guerra, basta pensar em Adenauer ou De Gasperi, ou talvez de maneira mais impressionante, Franco. Mas é verdade que, sob condições democráticas, ser mais popular no final do que no início de um prolongado período no poder é raro. Ainda mais raro — aparentemente até mesmo inédito — é que tal popularidade seja reflexo, não de diminuição ou moderação, mas de uma radicalização no governo. Hoje, existe apenas um governante no mundo que pode reivindicar tal conquista, o ex?operário que em janeiro deixou a presidência do Brasil com uma aprovação de 80% dos cidadãos. Por qualquer critério, Luiz Inácio da Silva é o político mais bem?sucedido de seu tempo.
O gosto dominante como gosto tradicional: Preferências e aversões estéticas das classes altas de São Paulo
Carolina Pulici
Resumo
Baseado em entrevistas semidiretivas com frações das classes altas de São Paulo e em críticas culturais veiculadas pela imprensa paulistana contemporânea, este artigo discute algumas visões que banqueiros, colecionadores de arte, embaixadores, fazendeiros, rentiers, filantropos, grandes empresários, altos executivos, industriais etc. constroem de si mesmos e dos outros em suas preferências estéticas declaradas. A análise de seus juízos de gosto em matéria de arquitetura, cinema e artes plásticas aponta para o apego aos valores artísticos tradicionais.
De modo geral, estudos sobre a elite brasileira contemporânea por um lado tendem a abordagens em termos das variáveis socioeconômicas que influenciam a mobilidade social, ocupacional e/ ou financeira, e por outro acentuam aspectos ligados ao consumo visto de forma ampla. Baseado em trinta entrevistas semidiretivas com membros das classes altas de São Paulo e em críticas culturais veiculadas pela imprensa paulistana contemporânea, este artigo discutirá algumas visões que banqueiros, colecionadores de arte, fazendeiros, rentiers, embaixadores, filantropos, grandes empresários, industriais, altos executivos, construtores etc. constroem de si mesmos e dos outros em suas preferências estéticas declaradas, as quais também contribuem para formar a “realidade” dessas elites.
Artigos / Articles
O gosto dominante como gosto tradicional: Preferências e aversões estéticas das classes altas de São Paulo
O gosto dominante como gosto tradicional: Preferências e aversões estéticas das classes altas de São Paulo
Por meio de rigorosa seleção de episódios, Kelsen enfatiza elementos que o debate filosófico?jurídico no Brasil muitas vezes considerou secundários. Nesse sentido, ainda que por contraste, sua autobiografia nos auxilia a traçar os caminhos pelos quais sua teoria foi aqui incorporada à Filosofia do Direito. Ao mesmo tempo, ela também nos ajuda a entender melhor os limites de nossa apropriação da Teoria pura do Direito.
Não parece datada a afirmação de que “ocupa?se uma posição no espaço jurídico conforme se está mais perto ou mais longe de Hans Kelsen”. Ainda hoje diversos juristas referem?se ao autor da Teoria pura do Direito como uma espécie de símbolo, ao mesmo tempo central e superior, para a compreensão do Direito.
No artigo, o autor explora a tese de que não há arte – e, particularmente, não há “arte contemporânea” – sem uma busca por novas ideias de arte, novas ideias do que seja a arte e de suas relações específicas com as instituições artísticas e com o próprio pensamento.
Como formular o problema da arte contemporânea — por meio de um manifesto? De um lamento? Minha intenção nestas notas é mais modesta. Gostaria de refletir a respeito do que é essa arte e quais “ideias de arte” ela implica ou inventa. Espero assim formular melhor as questões com as quais a arte contemporânea nos confronta.
Trabalhar para estudar: Sobre a pertinência da noção de transição escola-trabalho no Brasil
Álvaro A. Comin, Rogério Jerônimo Barbosa
Resumo
A acelerada expansão do ensino superior no Brasil trouxe para o sistema de ensino indivíduos pertencentes a grupos de menor renda que frequentam cursos noturnos e arcam privadamente com os custos dos estudos. Uma boa parte deles tem idade mais avançada do que usualmente se imagina: não são, a rigor, estudantes que trabalham, mas trabalhadores que estudam. Neste artigo a suposição usual de que a educação superior deva conduzir os indivíduos a nichos ocupacionais de maior qualificação formal é invertida, em favor da ideia de que são as condições do mercado de trabalho e a inserção ocupacional já conquistada pelos indivíduos o que dá sustentação ao esforço de voltar a estudar em busca do diploma superior.
Não há muita controvérsia quanto ao fato de que o desenvolvimento econômico depende da produção e disseminação de conhecimento — bem como das capacidades técnicas a ele associadas —, mesmo que a natureza desse conhecimento possa variar consideravelmente entre países e regiões. A educação, sobretudo a de nível superior, tornou?se, nas últimas décadas, um ativo altamente distintivo, capaz de promover (ou, na sua ausência ou baixa adequação, frear) o desenvolvimento. Para os indivíduos, o diploma de nível superior representa oportunidades de mobilidade social, por meio de carreiras profissionais mais promissoras quanto a realização pessoal, status social, direitos sociais e retornos salariais.
Artigos / Articles
Trabalhar para estudar: Sobre a pertinência da noção de transição escola-trabalho no Brasil
Trabalhar para estudar: Sobre a pertinência da noção de transição escola-trabalho no Brasil