O artigo faz uma releitura de algumas proposições da antropologia
interpretativista de C. Geertz e da antropologia pós-moderna, confrontando-as com a perspectiva rousseauniana de C. Lévi-Strauss, ou melhor, situando-as em relação à antropologia estruturalista. Aborda ainda a multiplicação dos estudos antropológicos sobre as sociedades contemporâneas e o repensar da própria disciplina. O autor argumenta que refletir sobre a construção do objeto antropológico implica discutir a inserção da antropologia no projeto colonial. Não basta enfatizar o estudo da posição do antropólogo, enquanto indivíduo, em relação aos informantes e ao local onde faz pesquisa de campo, sem que se aborde também a inserção deste na sua própria sociedade.
Autonomia e Subjetividade na Obra de Hélio Oiticica
O artigo examina a inserção da obra de Hélio Oiticica no processo de renovação do meio artístico brasileiro durante a década de 1950 e, especialmente, certas formulações estéticas cruciais que a mantêm na ordem do dia do debate contemporâneo. O interesse central do texto é compreender como os problemas culturais específicos de um contexto periférico puderam aí aparecer em chave universal, intrinsecamente ligados a problemas de ordem propriamente estética. Dentre as formulações de maior atualidade na obra do artista, caberia mencionar a questão da autonomia, da arte como reduto único do experimental, pressionando assim uma onipresente esfera da subjetividade, na qual biografia pessoal e projeto estético se entrelaçariam até se indiferenciarem. Daí a obra extrairia uma noção da forma das mais originais na arte contemporânea, uma noção holística empenhada em romper os limites da visualidade e a se exercer como espécie de prática cognitiva da vida cotidiana, prévia a toda especialização.
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Autonomia e Subjetividade na Obra de Hélio Oiticica
Autonomia e Subjetividade na Obra de Hélio Oiticica
Este texto, através da leitura de “Copérnico e os selvagens”, busca desenhar o perfil do projeto crítico que anima os diversos segmentos da obra de Pierre Clastres. Destaca-se, de um lado, sua apreciação dos procedimentos e pressupostos mobilizados pela antropologia política (a partir da perspectiva privilegiada oferecida pelas propostas metodológicas de J.-W. Lapierre); de outro, as novas balizas orientadoras que emergem do interior desta avaliação para o estabelecimento legítimo da ciência. O autor procura, enfim, apontar o sentido da “conversão heliocêntrica” proposta por Clastres para a disciplina, bem como assinalar a radicalidade de seu projeto crítico.
Economia e Ideologia: Aspectos da Questão Tributária
Tendo em vista a dimensão do ajuste fiscal requerido para consolidar o plano Real, o governo será provavelmente levado a buscar um aumento da carga tributária global. Esse aumento precisará vir acompanhado de uma mudança na desigual distribuição social dos impostos e da correção de diversas outras distorções. O fortalecimento da política tributária exigirá não só reforma tributária e emendas constitucionais, mas também uma administração tributária rigorosa, isto é, vontade política para combater a sonegação e recuperar as condições operacionais dos órgãos governamentais direta ou indiretamente envolvidos na arrecadação de tributos.
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Economia e Ideologia: Aspectos da Questão Tributária
Economia e Ideologia: Aspectos da Questão Tributária
Eleições, Fragmentação Partidária e Governabilidade
O artigo analisa as eleições de 1994 do ponto de vista dos efeitos da continuidade da fragmentação partidária sobre as relações entre o Executivo e o Congresso. O autor chama a atenção para o declínio dos dois grandes partidos e o aumento do número de partidos de tamanho médio. A fragmentação, que é relacionada aos interesses dos parlamentares, deve forçar um estilo de governo de base consensual. Mesmo considerando os aspectos negativos decorrentes da falta de base parlamentar do Executivo e das dificuldades de formação de uma maioria estável, o texto chama a atenção para alguns fatores que podem contrabalançar os aspectos negativos da fragmentação do sistema partidário nacional.
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Eleições, Fragmentação Partidária e Governabilidade
Eleições, Fragmentação Partidária e Governabilidade
Estabilização, Ancoragem de Preços e Política de Rendas
O artigo discute o problema da estabilização em economias de alta inflação – termo cunhado para caracterizar a situação vivida especialmente por economias latino-americanas na última década. Para o autor, o debate recente sobre estabilização, ao privilegiar o estabelecimento de uma âncora para os preços, desprezou a função de sinalizadores de preços que podia ser cumprida pelas políticas de rendas, utilizadas com sucesso em vários países.
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Estabilização, Ancoragem de Preços e Política de Rendas
Estabilização, Ancoragem de Preços e Política de Rendas
Estado e Empresários: Pequena Crônica de uma Relação Muito Delicada
Este final de século presencia uma mudança significativa na forma do relacionamento empresa-Estado. Nas últimas décadas as relações das grandes corporações com o poder passou a se centrar no lobby profissional atuando no Executivo e no legislativo, com o Estado assumindo explicitamente seu papel de defensor das corporações “nacionais” nas concorrências e operações globais, segundo uma lógica de ampla coincidência de interesses entre o objetivo privado e o do governo quando se trata de crescimento econômico e geração de empregos. O empresário brasileiro, assustado com as ações dos últimos governos em relação à abertura econômica, pressiona por uma política industrial que lhe permita decisões estratégicas na direção da competitividade e do mercado internacional. Mas também pressiona por menor abertura, apegando-se ao protecionismo do Estado. A ausência de perspectiva estratégica e a sensação de ameaça diante do investidor global produzem um momento delicado e rico de possibilidades, propício ao estabelecimento no Brasil de um novo padrão de relacionamento Estado-empresários que não passe pela proteção e o subsídio.
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Estado e Empresários: Pequena Crônica de uma Relação Muito Delicada
Estado e Empresários: Pequena Crônica de uma Relação Muito Delicada
Numa economia mundial mais aberta, tecnificada e competitiva, os sindicatos perdem força, e os problemas dos trabalhadores tendem a ser resolvidos dentro da empresa através de novos métodos de administração. Nos países mais avançados, os sindicatos descobriram que só poderão sobreviver se colaborarem na tarefa de educar os trabalhadores e ajudar a dominar as novas tecnologias. O Brasil, que abriu tardiamente sua economia, ainda está na era précontrato coletivo, com um “sistema estatutário” baseado em pouca negociação e muita legislação. A adaptação à nova realidade da economia mundial exige, segundo o autor, que o Brasil faça três grandes mudanças no campo trabalhista: abrir espaço para a emergência da contratação coletiva de forma descentralizada; dar às partes plena autonomia de negociar, afastando a Justiça do Trabalho dos conflitos de natureza econômica; e modificar a atual estrutura de organização dos sindicatos, dando aos empregados e empregadores toda liberdade para estabelecerem as entidades que melhor representem seus interesses. Paralelamente, deveria haver um substancial reforço das agências de educação e formação profissional com vistas a preparar e melhorar a qualidade de nossa mão-de-obra.
A vulgarização do uso do termo “governabilidade” pretende indicar com a expressão uma característica da máquina do Estado, tomando-a como sinônimo da capacidade estatal de governar. O problema da governabilidade se resumiria, nesse caso, em coisas como encontrar o tamanho certo do Estado, tornar mais ágeis seus mecanismos operacionais nas funções reconhecidas como próprias dele etc. Há, contudo, a sociedade – e há a política. E o desafio crucial reside na obtenção daquela forma específica de articulação do Estado com a sociedade na qual se reconheça que o problema da administração eficiente não pode ser dissociado do problema político, ou seja, do problema de garantir também a operação democrática do Estado. Portanto, a indagação subjacente à questão geral da governabilidade é, em última análise, a de como resolver a tensão contida na busca simultânea de eficiência e de democracia. Esses balizamentos informam a discussão do autor sobre a relação entre partidos e governabilidade no Brasil.
O artigo discute a questão palestina por meio de uma retrospectiva histórica do conflito árabe-israelense no Oriente Médio. O autor mostra como o sionismo só foi possível a partir da existência de condições para a emergência do Estado e do imperialismo modernos; aponta os equívocos em que incorreram as lideranças árabes em vários momentos, rejeitando propostas que teriam garantido aos palestinos um território maior do que o assegurado pelos acordos recém-assinados. Conclui, por fim, que a paz hoje interessa a ambos os lados, seja pelos interesses econômicos envolvidos, seja porque os israelenses parecem ter concluído que os territórios em jogo não valem uma batalha.
O artigo examina, através de exemplos extraídos de obras de Joaquim Manoel de Macedo, José de Alencar e Machado de Assis, a atitude desses autores em relação à vestimenta de seus personagens. Apresenta, assim, um painel da evolução do erotismo através das obras desses importantes romancistas brasileiros, na segunda metade do século XIX.
Manias, Pânicos e o Papel do Emprestador de Última Instância
Crítica: Livros Charles P. Kindleberger. “Manias, pânico e crashes: Um histórico das crises financeiras”. Porto Alegre: Editora Ortiz/Gazeta Mercantil, 1992, 303 pp.
Crítica / Review
Manias, Pânicos e o Papel do Emprestador de Última Instância
Manias, Pânicos e o Papel do Emprestador de Última Instância
No final dos anos 1970, um segmento da elite acadêmica via os movimentos sociais urbanos como uma “nova vanguarda” que substituiria o papel até então ocupado pelo movimento dos trabalhadores, cuja importância política estava em declínio. Quando esse fenômeno fracassou em atingir o alcance esperado, o desapontamento se instalou na comunidade acadêmica, que passou a fazer uma leitura pessimista dos movimentos sociais. Este artigo procura refutar essa visão tomando por base a análise dos movimentos urbanos ocorridos na Grande São Paulo desde a década de 1940 até o final da década de 1980. Para o autor, o pessimismo acadêmico em relação aos movimentos sociais está enraizado predominantemente na escolha pelos analistas de um eixo temporal irrealisticamente curto. A adoção de uma moldura temporal mais longa permite entender o enfraquecimento dos movimentos durante os anos 1980 como um fenômeno cíclico, e revela que as identidades dos movimentos sociais são fluidas e dependentes do contexto.
Celso Furtado relata o processo de gestação e colocação em prática das idéias que constituíram o pensamento econômico cepalino. Partindo de seus primeiros contatos com Raúl Prebisch, em 1948, e chegando até a atividade atual de Furtado, voltada para a análise da relação entre cultura e desenvolvimento, a entrevista apresenta um panorama detalhado da trajetória de um dos mais influentes economistas latino-americanos.
Perspectivas das Contas do Governo Federal em 1994-96
A experiência de programação e execução orçamentária do Tesouro Nacional e do INSS desde a posse de Fernando Henrique Cardoso como ministro da Fazenda – em meados de 1993 – representou um esforço árduo de ajuste por parte da área econômica do governo, embora com uma elevada dose de irrealismo. A arrecadação federal de 1994 será recorde, devendo permitir a conciliação do pagamento de parcela elevada do serviço da dívida com a execução dos programas governamentais prioritários – além de manter as transferências adicionais do INSS ao INAMPS no mesmo montante de 1993. Consequentemente, a crise financeira está adiada para o próximo ano ou para o exercício subsequente. O autor propõe que se busque uma solução orçamentária específica para os próximos dois anos, que possa servir de ponte entre o curto prazo e os primeiros efeitos das mudanças estruturais em gestação.
Artigos / Articles
Perspectivas das Contas do Governo Federal em 1994-96
Perspectivas das Contas do Governo Federal em 1994-96
A tensão existente na sociedade brasileira entre a tendência para uma mudança social progressista e – efeito perverso da década hiperinflacionária – a ânsia por ordem e estabilidade se resolveu, nas eleições presidenciais, em favor desta última, com a eleição do candidato que conseguiu, com o plano Real, tocar os umbrais da estabilidade. Contudo, no médio e no longo prazo, não é sociologicamente previsível que a maior parte do eleitorado, que votou em Fernando Henrique Cardoso, vá permanecer conservadora. Por outro lado, a adoção sem ressalvas dos fundamentos do neoliberalismo pela equipe econômica do novo presidente – a concepção de uma moeda neutra, uma mercadoria como qualquer outra – tende a subordinar a ação do Estado ao ciclo dos negócios privados. O autor entende por governabilidade a capacidade de governar apoiada em tendências muito concretas na sociedade e dirigida no sentido de um processo de liquidação das desigualdades sociais; assim, ele identifica no neoliberalismo da equipe econômica do novo governo o principal fator de ingovernabilidade do país.