Justifica-se certo otimismo, moderado e cauteloso como cabe, ante o progresso já realizado no incipiente parque industrial de informática, controlado nacionalmente. É evidente exagero proclamar, como fez recentemente a revista Senhor, que “Nossa informática é de briga”, que ela “não precisa ter nenhuma vergonha do que estão fazendo lá fora”. Exagero. Muita coisa foi feita. E para isso, a reserva de mercado foi essencial.
Resumo
Na história percorrida pela informática no Brasil (louvo-me para contá-la em Peter Evans) sobressai, de início, a luta de engenheiros e técnicos, da Politécnica da USP, da PUC. do COPPE e do SERPRO, do Rio, respaldados pelo Funtec do então BNDE. Convém lembrar também a convergência das preocupações daqueles grupos técnicos com o interesse de alguns setores das Forças Armadas, num período autoritário marcadamente infenso às pressões e aos interesses de larga parcela da sociedade civil. Luta no campo estrito do desenvolvimento tecnológico e na criação dos mecanismos essenciais de proteção: a formação da CAPRE e, depois a “reformulação” do setor, com a criação da SEI, esta gradualmente conquistada pelas idéias do grupo pioneiro, demonstrando ser básica a proteção via reserva de mercado para o desenvolvimento e domínio da tecnologia. Assim, criou-se, em poucos anos, capacidade tecnológica, real.
A 15 de novembro de 1982 mais de cinco milhões de eleitores paulistas consagravam o senador Franco Montoro como governador do Estado. Episódio sintomático da fase crepuscular na qual já ingressara o regime militar instituído em 1964, a vitória nas urnas do candidato do PMDB expressava uma esperança de mudança que se traduziu não somente nos elevados contingentes de votos que soube carrear, como, igualmente, na votação obtida pelos candidatos do PT, do PDT e, em grande medida, pelo inconformismo despolitizado de boa parte dos que optaram pela candidatura Jânio Quadros. Não é arriscado afirmar que praticamente dois terços dos paulistas votaram na oposição, ainda que as motivações e os matizes deste sentimento oposicionista fossem os mais diversos.
Resumo
Passados dois anos do pleito de 1982 e um ano e meio da posse de Franco Montoro já é possível realizar um balanço, ainda que parcial e precário, desta experiência. Para fazê-lo é indispensável partir de três referências: 1) o contexto no qual transcorreram as eleições de 1982; 2) o projeto político do candidato vitorioso no pleito; 3) as condições concretas dentro das quais transcorreram estes dezoito primeiros meses de mandato e que incidiram sobre a implementação (ou não) do programa.
Uma velha querela tática das esquerdas aflorou no debate eleitoral de 1982 em São Paulo. Disputar espaço nas instituições que aí estão ou acumular forças na sociedade? Discutia-se para que serviriam aquelas eleições — principalmente as de governadores de Estado — na luta contra o autoritarismo.
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A fala de despedida de Montoro do Senado, às vésperas da posse como governador, recolheu temas básicos do discurso oposicionista nessa fase: condenação da recessão como método de ajustamento; preocupação com as conseqüências sociais da crise econômica; defesa de uma renegociação da dívida externa preservando a soberania nacional; e, em resposta ao pedido de trégua de Figueiredo, a proposta de uma negociação interna para mudar a política econômica e completar a democratização do país. “Depois da eleição dos governadores dos estados, a eleição direta dos governantes em todos os níveis constitui uma exigência do povo brasileiro”.
Desde a posse dos governadores eleitos a 15 de novembro de 1982, pode-se configurar três períodos distintos do processo político. O primeiro segue-se à constituição dos novos governos estaduais. É momento de euforia, até porque se acreditava poder o processo de abertura ser acelerado com novas medidas democratizantes. A eleição direta para presidente da República e a Constituinte figuravam no horizonte do possível. O senador Teotônio Villela articulava parcelas significativas da oposição organizada e da opinião pública, iniciando a campanha que ele chamava diretas já.
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O governador Leonel Brizola confronta-se com um problema que lhe é próprio: o da constituição — melhor seria dizer, a reconstituição — de sua identidade política, que procura diferenciar, simultaneamente, das lideranças do regime e da oposição. São as dificuldades da trajetória de um líder que por longos anos foi compelido ao exílio pela ditadura; que acabou por constituir um pequeno partido com o qual venceria as eleições e que necessita afirmar uma liderança com objetivos peculiares. Dificuldades que esclarecem aspectos relevantes de seu comportamento político e administrativo.
Quinze meses de exercício governamental nos estados dominados pela oposição a partir de 1983 representam uma oportunidade propícia para uma avaliação do até agora realizado e um balanço dos fatores positivos e negativos alcançados. alcançados. O Rio de Janeiro apresenta, por uma série de motivos, características especiais para este balanço. Estado de tradição libertária e oposicionista, verdadeira caixa de ressonância com capacidade de espraiar ao restante do país os contecimentos políticos que aí ocorrem, o Rio de Janeiro — e especialmente a cidade do Rio de Janeiro, ex-capital federal que conservou um “quê” de cosmopolitismo e de desinteresse pelas questões provincianas locais — ainda conserva algo do mais caracteristicamente irreverente da cultura brasileira.
Resumo
As condições da ascensão de Brizola ao governo do Rio de Janeiro já são parte da História e desnecessária seria uma recapitulação minuciosa: herdeiro da tradição trabalhista que tem no 2° governo Vargas e na carta-testamento os seus paradigmas básicos, Brizola retornou ao Brasil em 1979, após quinze anos de exílio, visando reconstruir o movimento político que tivera, no governo João Goulart, a sua fase de auge e apogeu. Uma das principais vítimas do movimento de 1964, o trabalhismo pagou um preço elevado pela sua opção nacionalista e de defesa das reformas de base e da justiça social expressados com vigor no período Goulart.
Alguns estudos mais ou menos recentes apontam para a flagrante precariedade do marco teórico em que se baseia a maior parte das reflexões sobre a temática dos movimentos sociais urbanos no Brasil. Argumenta-se, em geral, que, apesar da contribuição que possam trazer à compreensão de realidades locais, as análises desses movimentos pecam pelo empiricismo e pela incapacidade de especificar para a realidade brasileira os já frágeis modelos teóricos elaborados com base na realidade dos países capitalistas avançados. Mas em que reside, afinal, tal precariedade teórica?
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O artigo analisa as relações entre o movimento favelado e o poder público a partir da experiência de urbanização de favelas em Belo Horizonte no início dos anos 80. Após discutir as limitações da matriz teórica que inspira a maior parte da produção acadêmica sobre os movimentos sociais urbanos na década de 70, o autor conclui que parte da responsabilidade pela desarticulação do movimento favelado e dos programas “participacionistas” em Minas Gerais cabe às chamadas forças progressistas instaladas no aparato público após a eleição de Tancredo Neves para o governo do estado.
Cremos ser possível afirmar que os movimentos sociais de base local caracterizam-se pelo fato de emergirem e se organizarem em torno de reivindicações relativas ao consumo coletivo e de terem como interlocutor privilegiado o Estado. É claro que a generalidade dessa afirmação é problemática pois, como lembram Machado da Silva e Ziccardi, “incluem-se na rubrica ‘movimentos sociais urbanos’ as mais diversas formas de expressão, mobilização, organização e luta dos setores populares urbanos” além de “formas de expressão das classes dominantes como, por exemplo, os movimentos ecológicos e os de defesa de certos direitos de propriedade e uso do solo”.
Foi-se o mundo de antigamente. A revolução tecnológica alterou por completo nossas relações com a natureza e com o outro. Vivemos mergulhados numa segunda natureza constituída de máquinas sábias, verdadeiros raciocínios ambulantes os quais pegamos o começo e o fim. O protótipo da máquina moderna, o computador, não tem nada a ver com a ferramenta, que prolonga o gesto e poupa esforços; consiste na encarnação duma teoria, saber feito material volátil, que por si só a verifica e abre um espaço inédito que o conhecimento do indivíduo nunca poderia desenhar. O computador é um cientista coletivo posto à disposição do pesquisador ou da dona-de-casa. Por isso reúne, no seu pequeno intervalo, a teoria e a prática, sendo o exemplo mais extraordinário de como a ciência neste século se transformou numa força produtiva.
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Se se perde de vista a função peculiaríssima que o saber assume no cerne da barbárie contemporânea, corre-se o risco de se tomar a Universidade pelo que ela pensa de si mesma. Não estou negando a validade do ideal daquela comunidade de sábios que se reúnem para preservar os conhecimentos do passado, investigar as condições do presente e preparar os sábios do futuro. Apenas vejo que esse ideal se integra num movimento de socialização que resulta na conversão da Ciência em força produtiva e fonte dum monopólio em que o capital contemporâneo haure sua força. O intelectual não trabalha para a humanidade, mas para o Estado, não só porque em grande parte é funcionário público, mas ainda porque é o Estado o grande responsável pelo financiamento da pesquisa básica e aplicada. Isto no Brasil, como em qualquer país estrangeiro.
Pedimos ao professor Wanderley Guilherme, quando ainda no cenário político existia a perspectiva de negociação à base do próprio projeto do Governo Federal de diretas para 1988, que nos preparasse um artigo sobre o tema da negociação. Inclusive porque conviria trazer para o debate algo além da surrada concepção udenóide de negociação como “traição, conchavo” e outros quejandos. O que se passou desde então, com a retirada do próprio projeto denominado Figueiredo, é sobejamente conhecido. Eis que o desfecho daquele processo estava antevisto no curto artigo do professor Wanderley Guilherme, pelo que o publicamos como uma excelente amostra do que pode fazer uma análise política limpa de preconceitos. Afinal, não é todo dia que uma análise política preditiva consegue ver-se confirmada.
Resumo
Na Enciclopédia Internacional de Ciências Sociais lê-se a definição seguinte: “Negociação é uma forma de interação mediante a qual indivíduos, organizações e governos explicitamente tentam (ou fingem tentar) obter nova combinação de alguns de seus interesses comuns ou conflitantes”. O exame do simples enunciado, e de algumas de suas condições, permite concluir que, se negociação consiste no que a definição expressa, então muito dificilmente o Planalto será partícipe de qualquer negociação respeitável que venha a ocorrer no futuro imediato.
Mil novecentos e oitenta e quatro. Faz vinte anos, ruía na América Latina o governo eleito do Brasil. Esta queda iniciou a série de golpes militares no continente. Pouco a pouco, como num jogo de dominó, foram caindo governos atrás governos: o de Ilia, na Argentina, o de Belaunde, no Peru, o do Uruguai, o da Bolívia, até que – suprema humilhação para o regime que era a quintessência da democracia latino-americana – deu-se a tragédia de Allende, em 1973.
Resumo
O Cone Sul inteiro, virava um grande Paraguai (onde Stroessner já comemora mais de trinta anos de ditadura militar). Daí por diante, a literatura especializada
em sociologia política foi pródiga na descrição dos regimes militares e no vaticínio sobre seu destino à durabilidade. Houve, sem dúvida, acertos razoáveis na análise. Dois foram os debates que apaixonaram: a relação entre desenvolvimento econômico e ditadura militar e a natureza propriamente política dos regimes recém-instalados.
A primeira parte destas notas procura mostrar que a atual crise que o Uruguai sofre é, ao mesmo tempo e intricadamente, política e econômica. Ao desestruturar o sistema político preexistente, o regime autoritário confere à direção econômica uma elevada autonomia de decisões, já que se torna politicamente possível preterir certos interesses e privilegiar outros.
Resumo
A crise — cujo símbolo é a desnacionalização — evidencia a existência de uma oposição real de interesses que coloca, de um lado, os trabalhadores, as camadas médias e amplos segmentos das classes proprietárias, e, de outro, o capital financeiro internacional e segmentos do capital nacional a ele associados. No nível da superestrutura política, essa oposição se reflete na contradição entre democracia e autoritarismo.
Reproduzimos aqui alguns flagrantes da literatura que circulou na imprensa operária do Brasil no começo do século. São contos breves que trazem imagens de um tempo forte da vanguarda libertária, em pleno esplendor do academismo. Fragmentos de um processo literário autônomo cuja força, a euforia posterior à Semana ajudou a esquecer.
Resumo
Essa literatura, como lembra Edgard Leuenroth, serviu de elo de identificação intelectual dos trabalhadores num tempo também forte de opressão e violência que só a palavra escrita registrou com grandeza. São episódios que põem em cena o cotidiano opressivo da fábrica, a trajetória dos heróis anônimos da resistência anarquista, a paródia corrosiva da cena burguesa, a figuração alegórica da revolução proletária, a caricatura instantânea dos inimigos da causa, passando pelo comerciante, pelo padre e o militar.
Terminado o primeiro semestre de 1984, as atenções se voltam para a performance da economia brasileira. No marco do programa de ajuste do Fundo Monetário Internacional, a situação é inquestionavelmente melhor do que aquela prevalecente em 1983, quando as metas do FMI eram sistematicamente descumpridas, gerando sucessivos pedidos de waivers ao board daquela instituição. Este ano, pelo contrário, as metas foram, em geral, alcançadas com relativa folga, encontrando-se os resultados mais expressivos no déficit público e na balança comercial.
Resumo
O novo aumento da taxa de juros a nível internacional voltou a explicitar o estreito grau de manobra da política econômica norte-americana. No dia 25 de junho, pela quarta vez no semestre, a Prime subiu mais meio ponto percentual nos Estados Unidos, alcançando o nível de 13% a.a. Com este último aumento observou-se, no intervalo de três meses, uma elevação de dois pontos percentuais desta taxa.