Resumo
Eram os idos de outubro de 1972. O Cebrap lançava, então, o segundo número de sua revista, à época denominada Estudos Cebrap. Como carro‑chefe, oferecia ao leitor um longo ensaio de quase oitenta páginas que, nos dias atuais, seria certamente recusado por dez entre dez editores.
DOSSIÊ DESIGUALDADES EM SAÚDE NO BRASIL E EM MOÇAMBIQUE | Introduction: The accountability politics of reducing health inequalities: learning from Brazil and Mozambique
Laura Trajber Waisbich, Alex Shankland, Gerald Bloom e Vera Schattan P. Coelho
Resumo
Inequality is a key political issue of our times. It has political consequences, fuelling conflict and raising legitimacy challenges for regimes around the world, in democratic and non‑democratic settings alike. At the centre of these challenges is the question of accountability: who can be held accountable, on what basis, how and by whom for tackling or failing to tackle which inequalities. In the field of global health, inequality has long been a key issue. A significant body of work — in global health and health systems research — has approached the issue of health inequalities and inequities by highlighting the role of social determinants (Marmot, 2015; Wilkinson; Pickett, 2006; Barreto, 2017). A more recent and less developed stream of work frames them in terms of political determinants: in other words, seeing them as issues that may be addressed through politics as well as policy.
DOSSIÊ DESIGUALDADES EM SAÚDE NO BRASIL E EM MOÇAMBIQUE | Introduction: The accountability politics of reducing health inequalities: learning from Brazil and Mozambique
HEALTH INEQUALITIES IN BRAZIL AND MOZAMBIQUE DOSSIER | Apresentação: as políticas de accountability na redução de desigualdades em saúde: aprendendo com Brasil e Moçambique
Laura Trajber Waisbich, Alex Shankland, Gerald Bloom e Vera Schattan P. Coelho
Resumo
O artigo apresenta um panorama da trajetória recente das desigualdades em saúde nos dois países. Partindo da sistematização de dados produzidos pelos órgãos oficiais, de estatística e saúde, mostra como evoluíram os indicadores de acesso à saúde. Observa‑se a redução das desigualdades em período recente em ambos os países, sendo de forma mais acentuada em Moçambique, em função do aumento da atenção primária à saúde nas áreas rurais.
Palavras‑chave desigualdades em saúde; Brasil; Moçambique; atenção primária.
Abstract
The article presents an overview of the recent trends on health inequalities in two countries. It shows how service provision and social health‑related indicators have progressed using administrative data produced by official authorities. Both countries present reduction on health inequalities. Mozambique has produced further pronounced results due to increasing access to primary health care in rural areas.
Keywords health inequalities; Brazil; Mozambique; primary care.
Resumo
Em São Paulo, as desigualdades em saúde decresceram entre 2001 e 2016. Esse fato não é trivial, dada a bem conhecida dificuldade em reverter desigualdades. A partir do conceito de accountability, fundado na teoria de principal‑agente, enfoca‑se a implementação da política de atenção primária à saúde no município. A análise destaca o papel da acirrada competição eleitoral, dos conselhos de saúde e dos contratos — entre o governo federal e o município, e entre este último e as OSs — para promover esses resultados.
Palavras‑chave SUS; política de saúde; desigualdade; accountability; contratos.
Abstract
In the megacity of São Paulo health inequalities decreased between 2001 and 2016. These distributive results are striking given how difficult it is to reverse inequalities. The article focuses on the implementation of the primary health care policy in the city, highlighting the role of three accountability
mechanisms in promoting these results: fierce electoral competition, health councils and contracts — between the federal government and the municipality, and between the latter and the OSS.
Keywords Brazilian public health care system; health policy; inequalities; accountability.
Resumo
Este artigo analisa a relação entre diferentes formas de accountability no contexto do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena do Sistema Único de Saúde (SASI‑SUS), por meio de um estudo de caso do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) do rio Negro, localizado no estado do Amazonas. A partir de um episódio de mobilização indígena iniciado após um surto de malária no DSEI, o estudo aponta alguns dilemas fundamentais decorrentes da incorporação de lógicas conflitantes de accountability ao desenho do SASI‑SUS.
Abstract
This article discusses the interplay of different forms of accountability in the context of the Indigenous Health Subsystem of Brazil’s Unified Health System (SASI‑SUS), via a case study of the Rio Negro Special Indigenous Health District (DSEI-ARN) in the State of Amazonas. Focusing on a case of indigenous mobilisation triggered by a malaria outbreak it highlights some of the underlying dilemmas that derive from the embedding of conflicting accountability logics within the architecture of the sasi‑sus.
Keywords accountability; social movements; indigenous health.
Resumo
A partir de minietnografias realizadas em duas cidades municipais — Maputo, tomado como modelo de “descentralização municipal em saúde”, e Quelimane, onde o processo de descentralização de serviços de saúde foi adiado —, este artigo argumenta que o gradualismo na transferência de competências do governo central aos municípios, sem roteiro claro, contribui para a diluição das responsabilidades do Estado ante os cidadãos e fragiliza os mecanismo de prestação de contas.
Abstract
Through the use of mini‑ethnographies in two municipalities: Maputo, considered a model for “municipal health decentralization”, and Quelimane, where the health decentralization process has been delayed, this article argues that the gradualism in the transfer of responsibilities from the central government to the municipalities, without a clear road map, contributes to the dilution of state responsibilities towards its own citizens and weakening of accountability mechanisms.
Keywords municipal decentralization; inequities; health; Mozambique.
Resumo
O artigo discute a associação problemática entre as noções de memória e de técnica nos relatórios produzidos por instituições promotoras de grandes barragens. Analisando a documentação do setor elétrico relativa à construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, no Pará, o trabalho ressalta o modo como o esquecimento — metodologicamente construído — da memória dos grupos sociais atingidos contribui para o entendimento do “social” pelos promotores dos grandes projetos como um simples problema instrumental “a resolver”.
Palavras-chave
memória; técnica; grande projeto; Tucuruí.
Abstract
The text discusses the problematic association between the notions of memory and technique in reports done by institutions responsible for big dams. By analising electric sector documents related to the Tucuruí hydroelectric dam construction, the text stresses the way that the methodological oblivion of the memory of social groups affected by the dam impacts leads to the (mis)understanding of social issues raised by huge infrastructure projects as simple instrumental problems to be “solved”.
Resumo
Inspirados na metáfora visual cognitiva de Scott em Seeing Like a State, propomos a noção de institucionalização simbólica. Nela, são enfatizadas as disputas e a circulação de categorias e formas de classificação do mundo dos movimentos sociais. Sugerimos que atentar para tais formas simbólicas é heuristicamente proveitoso à compreensão da gênese e da transformação de capacidades cognitivas do Estado, institucionalizadas em políticas públicas via interações com os movimentos.
Abstract
Inspired by Scott’s visual cognitive metaphor in Seeing Like a State, we develop the notion of symbolic institutionalization shedding light on the disputes around social movements’ categories and forms of classification, as well as their circulation. The attention given to such symbolic forms is fruitful to the comprehension of the genesis and transformation of the state cognitive capacities, institutionalized via interactions with social movements within the space of certain public policies.
Keywords symbolic institutionalization; social movements; cognitive state capacities; public policy.
Resumo
Partindo da apresentação das três modalidades de ativismo estatal que predominaram no Brasil desde os anos 1930, este artigo analisa as políticas industriais formuladas e implementadas entre 2004 e 2014. Argumenta a favor de uma política industrial vertical e seletiva, priorizando setores capazes de difundir progresso técnico e inovações para toda a estrutura produtiva, e advoga a necessidade de fortalecimento e reorientação institucional da estrutura de governança da política industrial.
Palavras‑chave
política industrial; novo ativismo estatal; Brasil.
Abstract
Beginning from the presentation of the three different forms of state activism in Brazil throughout the twenties and twenties one, this paper aims to analyze the industrial policy formulation and implementation processes in the renewed state activism of the last twenty years. It argues in favor of a selective industrial policy, capable of innovation and productivity dissemination throughout all sectors.
Keywords industrial policies; new state activism; Brazil.
Abstract
This article aims at establishing a dialogue between the theory of hegemony of Ernesto Laclau and the categorial interpretation of Marx by Moishe Postone. First, I will show that the hegemonic logic of Laclau appears logically constituted by the dynamic of capital as Postone studies it. Second, I will defend the relevance of the hegemonic conception of politics, no longer as an originary social ontology, but as a limited (yet partially effective) social logic characteristic of capitalist society.
Resumo
Este artigo estabelece um diálogo entre a teoria da hegemonia de Ernesto Laclau e a interpretação de Marx por Moishe Postone. Mostrarei, em primeiro lugar, que a lógica hegemônica de Laclau aparece constituída pela dinâmica do capital como estudado por Postone. Em seguida, defenderei a relevância da concepção hegemônica de política, não mais como uma ontologia social originária, mas como uma lógica social limitada (mas parcialmente eficaz) característica da sociedade capitalista.
Resumo
O artigo discute a análise que Adorno faz do cinema em momentos diversos de sua obra. Apresenta um texto pouco discutido que ele escreveu com o compositor Hanns Eisler, quando ambos viviam em Los Angeles, e que tem como tema central a presença da música no cinema. Ademais, demonstra como alguns ensaios de Adorno dos anos 1960 procuram reconsiderar o cinema e discutir as suas potencialidades em diálogo com o Novo Cinema alemão.
Palavras‑chave Theodor W. Adorno; Hanns Eisler; Novo Cinema alemão; Teoria Crítica; Cinema.
Abstract
The article discusses Adorno’s analysis of cinema at different moments of his oeuvre and presents a scarcely discussed text, written with the musician Hanns Eisler while both lived in Los Angeles, which has as its central theme the presence of music in the cinema. In addition, it tries to demonstrate how some essays written in the 1960s try to reconsider the cinema and to discuss its potentialities in dialogue with the so‑called New German Cinema.
Keywords Theodor W. Adorno; Hanns Eisler; New German Cinema; Critical Theory; Cinema.
Resumo
Trata‑se de uma análise das memórias inéditas de Brazília Lacerda (1887‑1966), cobrindo um período de treze anos entre sua infância e o casamento, em 1906. Procura‑se entender a relação entre circunstâncias históricas (a plantation, o boom do café, marcas de classe, escravidão, preconceito) e a vida privada (características de gênero, educação, aspirações e responsabilidades femininas). O texto faz também um comentário sobre a autobiografia como gênero.
Abstract
Analysis of the unpublished Memórias de Brazilia Lacerda, regarding her childhood until her marriage in 1906; the text seeks to understand the relationship between historical circumstances (plantation, the boom of coffee crops, signs of class, slavery, prejudice) and private life (circumstances of gender, education, aspirations and female responsibilities); brief commentary on autobiography criticism.
Keywords The boom of coffee; slavery; abolition; plantation; owners; autobiography; cultural memories.
Luli Penna nasceu em São Paulo, em 1965. Bacharelou-se e defendeu mestrado em Letras na USP para, logo depois, tornar-se ilustradora e cartunista. Colaborou com diversas revistas, editoras e com o jornal Folha de São Paulo, onde publicou, entre outras coisas, a série de cartuns Aqui na Esquina (2013 a 2015). Participou do Salão de Humor de Piracicaba (2011), da Bienal de Quadrinhos de Curitiba (2018) e da Residência SESI|Bienal de Quadrinhos de Curitiba (2018). Colaborou com as antologias Mulheres em quadrinhos (2019), Catálogo HQ Brasil – 10 anos de quadrinhos (2019) e Anthologie de la bande dessinée brésilienne (no prelo). Em 2017, publicou sua primeira graphic novel, Sem dó (Todavia).
Esse trabalho nasceu de desenhos de observação da paisagem litorânea do estado de São Paulo. Ao longo do processo, desenhos incialmente muito detalhados se tornaram cada vez mais simples e abstratos, delineando uma sequência narrativa que se consolidou como história de um horizonte. Ao cindir e se transformar, as rochas formam diversas paisagens, sugerindo leituras que vão dos elementos da natureza aos edifícios arquitetônicos do país, da calmaria marinha ao drama teatral, da monumentalidade da pedra à sua destruição.